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Kundalini e a arte de enganar os outros


Entre palavras em sânscrito, promessas de expansão da consciência e explicações esotéricas sobre o “despertar da energia adormecida”, o conceito de Kundalini tornou-se um dos pilares mais mal interpretados — e mal utilizados — no universo do Yoga contemporâneo. Não por sua complexidade intrínseca, mas pela forma superficial, muitas vezes fantasiosa, como é transmitido em cursos, aulas e retiros ao redor do mundo. Trata-se, em muitos casos, de uma arte silenciosa de enganar, revestida de incensos, vocabulário místico e uma autoridade autoproclamada que raramente é questionada.


Esse tipo de discurso, embora encantador aos olhos e ouvidos menos treinados, mascara a falta de profundidade teórica e prática de boa parte dos chamados “instrutores de Yoga”. Sob a fachada da espiritualidade, perpetua-se um ciclo de desinformação, colocando em risco não apenas a credibilidade do Yoga, mas a experiência genuína daqueles que o buscam com sinceridade.



Chakras, cores e silêncios constrangedores: o discurso esotérico como cortina de fumaça


A cena é familiar para qualquer frequentador eventual de aulas de Yoga: ao tocar no tema Kundalini, o instrutor assume um tom solene e começa a descrever, com segurança quase teatral, uma energia serpentina que dorme enrolada na base da coluna e que, uma vez despertada, ascende por centros sutis de poder chamados chakras, culminando no estado de iluminação. À primeira vista, parece profundo.


Mas, ao tentar ir além da superfície e questionar os significados, fundamentos ou até as fontes dessas explicações, o aluno encontra um vazio retórico, frequentemente preenchido com metáforas vagas ou jargões espirituais.

Essa blindagem discursiva protege um tipo de autoridade que se sustenta, paradoxalmente, na falta de questionamento. Afinal, quem ousaria contradizer o "guru" em meio à penumbra do incenso e dos mantras? Quantas vezes o aluno silenciou sua dúvida por receio de parecer cético, ignorante ou “pouco evoluído”?


No lugar de estudo sério dos textos clássicos — como Hatha Yoga Pradipika, Yoga Sutras de Patanjali ou Samkhya Karika — o que se vê é uma repetição quase litúrgica de conceitos herdados sem crítica, sem contexto e, muitas vezes, sem sentido. A suposta sabedoria sobre Kundalini frequentemente vem de segunda, terceira ou quarta mão — com mais cores do que conteúdo.





O que é, afinal, Kundalini? Uma abordagem honesta e fundamentada


Para compreender Kundalini de maneira minimamente coerente, é necessário romper com o misticismo performático e adentrar a lógica interna do Yoga tradicional. Nas fontes clássicas, o conceito está associado a uma condição energética específica, que não ocorre por acaso, tampouco por meio de posturas extravagantes ou músicas “celestiais”. Kundalini, dentro de uma visão mais plausível e neurobiológica, pode ser interpretada como um estado de ativação profunda do sistema corpo-mente, provocado por técnicas específicas de respiração, contração muscular (bandhas), meditação e visualização.


Esse estado, longe de ser mágico, favorece a emergência de habilidades cognitivas superiores — como foco, clareza, intuição e discernimento — tão necessárias para alcançar o estado de samadhi, a superconsciência descrita nos Yoga Sutras. É uma condição rara, fruto de disciplina constante (tapas), autoestudo (svadhyaya) e entrega (ishvarapranidhana), não de atalhos esotéricos.


A ciência ainda não oferece uma explicação definitiva sobre o fenômeno, mas há pontos de convergência: os chakras, por exemplo, têm sido relacionados ao sistema endócrino, cujas glândulas são responsáveis por processar os estados hormonais e emocionais que moldam nossa experiência subjetiva.


Portanto, o verdadeiro risco não é apenas acreditar em histórias mirabolantes sobre Kundalini. É aceitar a superficialidade como suficiente. É deixar de perguntar. É não exigir, como faríamos em qualquer outro campo do saber, explicações plausíveis, fundamentadas e consistentes. Porque o Yoga — o verdadeiro Yoga — exige esforço, estudo e maturidade. E nenhum desses aspectos floresce sob a sombra da ignorância disfarçada de iluminação.






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